A fantasia de ser criança ou desejar voltar a sê-lo




A fantasia é uma arte e um engenho que a todos, em algum momento das nossas vidas, nos presenteou.
Fui criança e vivi, sem saber, esse tempo com a profundidade dos mares e a arte dos poetas ou dos pintores.
As minhas memórias registam uma milésima parte das cores e das imagens que algures povoaram as minhas fantasias.






 




O Lobo enamorado do Capuchinho (Barro 2011)









 O Buraco - do coelho e da Alice (Barro 2011)








O Lobo e os 3 Porquinhos (Barro 2011)



 
Lembro-me das florestas e dos jardins que imaginei no pequeno quintal da minha avó.
Lembro-me das flores de muitas cores e feitios que nasciam por entre as ervas daninhas do bosque, ao fundo do bairro.













Bonsai revivificado (Madeira e barro 2012)










  
Bonsai azul (Madeira e barro 2016)



Lembro-me da água, da terra e da lama que me ajudaram a inventar rios e barragens e dos pedaços de telha velha que me ajudaram a desenhar estradas no cimento.
Lembro-me das formigas que povoaram os trilhos dos meus exércitos e dos caules ocos das azedas como instrumentos das minhas orquestras.











Coro Esgargalado e Orquestra Sinfénica (Barro 1983/2010)



Recordo quase tudo e quase todos os que habitaram, comigo, em cumplicidade, essas vivências.
Ser criança é ser simples, quase puro, límpido e, como a oliveira, simbolizar a paz ou então, pelo menos, a luz do farol de azeite numa candeia.
Cresci rodeado de talentos e valentias, movimentei-me em espiral, rodopiando e reinventando menos marés que marinheiros, esperando sempre poder reviver aqueles tempos e os seus encantos, nem que fosse por uma noite de sono ou uma manhã de sonho.
Vivemos a desejar tornar-nos sábios interlocutores do infinito, mágicos e inventores de mil e uma maneiras de voltar a ser, infantilmente, artistas e, nessa arte, fantasiar felicidade, relembrando bonecas e bolas de trapo, piões, berlindes de bugalhas, automóveis de arame e cortiça, embalados por simpatias e geradores de saudáveis invejas.
Vivemos a desejar voltar a brincar aos polícias e aos ladrões, aos merceeiros e aos clientes, aos médicos e aos doentes, mas afinal acabamos a brincar aos poderosos.
É por termos escondido a infância no mais recatado canto da última gaveta que retomamos, por instantes, nestes momentos de nostalgia (ou de sentimento de culpa), a busca da imaginação perdida (a outra metade da laranja), e fazemos de conta que nos cheira às iguarias que fumegavam das panelas das nossas pequenas namoradas, onde, à mistura, se cozinhava relva, pétalas de flor e rosmaninho!
Vivemos repartidos entre duas metades de infância: a do tempo curto para imaginar, se houver espaço, e a do espaço imenso para recordar, se houver tempo.












Meio-dia (Acrílico em tela 2008)











Meia-noite (Acrílico em tela 2008)


Vivemos comprimidos entres duas metades de arte: a criatividade sem limites da infância (a arte pura) e a reprodução contida das conveniências (a arte apurada).


É por isso que hoje, de vez em quando, nos encontramos.
Será que procuramos encontrar o segredo para juntar as duas metades da laranja, ganhando, de novo, a dimensão de crianças e artistas?
Ainda não desisti dessa fantasia, e anseio abraçar quem conseguir encontrar a solução. 












 
Fantasiar (Pintura Moldada sobre tela 2012) 




Será que é logo ao fim da tarde?

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